Vamos regulamentar o direito de reunião?
Por Gabriel Bulhões
Esse texto tem a missão de relatar uma experiência recentemente vivenciada, que ocorreu de forma quase completamente aleatória. Durante minha última estadia em São Paulo, aproveitei para participar de um evento organizado por um querido e brilhante professor que tive na graduação, uma das minhas primeiras referências acadêmicas, e um pesquisador de alta patente, com mestrado, doutorado e pós-doutorado na Alemanha: o Professor Leonardo Martins.
Fiquei sabendo do evento poucos dias antes, e aproveitei que cheguei à cidade há tempo de deixar as malas e correr para participar do evento intitulado “Liberdade de reunião e seus limites constitucionais”.
Confesso que quando me dirigia para lá, um frio na espinha me tomava conta da alma… Tratar da mera hipótese de regulamentação do direito de reunião em uma conjuntura como a que o Brasil vive atualmente é uma situação muito temerária. Ao longo da noite de palestras, pude perceber o tom técnico e qualificado do debate, que buscou trazer a experiência alemã na regulamentação dessa liberdade (direito de reunião) como um modelo indicado para nortear os debates e os trabalhos nesse sentido.
Através Lei de Reunião (Versammlungsgesetz), que regulamenta a matéria na Alemanha, editada em 1978, foi proposto uma proposta modelo para tratar a disciplina do exercício dessa liberdade fundamental. O direito de reunião, afinal, é um dos pilares basilares da democracia; merece, pois, uma especial atenção nossa.
Contudo, pedindo vênia e já relutando contra a perspectiva mimética para com a teoria alemã, temo que a importação das teorias formatadas por e para os países centrais, que somos acostumados a presenciar no Brasil pode fazer com que tenhamos efeitos colaterais os mais desastrosos, tendo em vista nosso próprio recorte de sociedade periférica, marginal e pós democrática, onde impera a seletividade brutal do nosso sistema punitivo e de nossas agências de controle.
Foi muito bom poder ver um professor meu, talvez a primeira grande referência acadêmica que tive (que parabenizo pela tecnicamente brilhante explanação proferida na ocasião, já citado professor Leonardo Martins), orquestrar todo o evento de altíssimo nível que reuniu pesquisadores de altíssima qualidade, como o Prof. Ralf Poscher da Alemanha (um dos idealizadores da Lei de Reunião alemã), da Professora Flávia Piosevan (que estava representando o Ministro da Justiça na época, Alexandre de Moraes) e do Professor Marcos Zili (USP).
Certamente na fala do professor Zilli foi onde mais me senti contemplado. Eu não conhecia o mesmo, mas passei a admirá-lo instantaneamente por impor uma análise realista e consequencialista no debate. Não pude deixar de perceber a sensibilidade com que tratou o tema, inclusive relacionando-a com nossa Lei Anti-terror. Foi a única fala da noite que se colocou claramente contrária à possibilidade de regulamentação dessa liberdade, tendo em vista as especificidades da sociedade brasileira atual. Lançou, ainda, luzes sobre a ideia de que, caso queiramos falar em regulamentação nessa hipótese, devemos observar os limites constitucionais colocados no Art. 5º XVI da nossa Carta Magna.
“Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente” é o texto constitucional que tutela o direito de reunião, e a ele devemos nos ater. Nesse sentido, temos que algumas exigências são colocadas pelo constituinte; mas, somente uma delas dá margem à regulamentação estatal, qual seja: a indicação da autoridade responsável por receber esse “prévio aviso”. Nada mais pode ser regulamentado, pois não há margem normativo-constitucional para isso.
No mais, temos, por exemplo, que as reuniões devem ser “pacíficas”, “não armadas”, sendo impedidas de frutarem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local e hora. O texto ainda vai além, sendo expresso e claro ao afirmar que as reuniões independem de qualquer “autorização”.
Encerrados os trabalhos do primeiro dia, retorno ao segundo dia pela manhã ao prédio da AASP, para um “café da manhã” onde o então Ministro Alexandre de Moraes convidara diversas instituições para amadurecer o debate em torno do tema. Além do Professor Ralf Poscher e da representante do organização alemã financiadora do evento, estavam os professores Leonardo Martins e Flávia Piovesan (a qual conduziu os trabalhos em nome do Ministro, o qual, como já citado, não compareceu ao seu próprio “café da manhã”).
Ao contrário do evento do dia anterior, esse evento ocorreu à portas fechadas, com 30 convidados. Eu tive a honra e a sorte de ter sobrado uma vaga por uma desistência, ocasião na qual um amigo que auxiliava o professor Leonardo na organização do evento me convidou, o que foi de pronto aceito por mim. Ao todo estavam representadas as principais instituições do Sistema de Justiça Criminal, como a Justiça Federal, a Justiça Estadual (representada pelo TJSP), MP/SP, MPF, e a PM/SP. As únicas instituições não governamentais convidadas foram a CONECTAS Direitos Humanos e a Artigo 19, sendo que somente a CONECTAS se fez presente, através do Rafael Custódio, o qual fez uma fala brilhantemente lúcida e combativa.
Rafael trouxe dados que são inerentes ao Brasil que vivenciamos hoje. Lembrou que o debate e a promulgação da Lei Anti-terror ocorreu logo após o início das grandes manifestações, em 2013. Ventilou que o controle (tanto interno quanto externo) nos casos de abuso das forças de segurança na repressão às manifestações é praticamente nula, gerando impunidade e um reforço positivo sobre essas condutas perpetradas sistematicamente pelos agentes policiais em determinadas manifestações políticas. Ressaltou, ainda, a recente declaração da OEA sobre a repressão à manifestações no Brasil, a qual é reflexo da brutalidade corriqueira com que se lidam os protestos no Brasil, onde não faltam exemplos de pessoas que, por exemplo, ficaram cegas durante esses atos em decorrência da violência policial. Relevou, também, o papel do judiciário, que muitas vezes, por ação e/ou omissão, chancela e legitima esses tipo de conduta, como no caso do jornalista que morreu durante um protesto e foi negado o direito à indenização da família dele sob o argumento da “auto-colocação em risco”.
Foi falado, ainda, com relação ao uso de armamento menos-letal, em algumas problemáticas. O fato de a regulamentação do uso desse tipo de armamento ser realizado pelo exército, em vez de, por exemplo, o Ministério da justiça (órgão civil), foi uma delas. Outra foi a importância de um debate sério para a elaboração de um “manual” padrão para utilização desses equipamentos, tendo em vista que hoje não há qualquer recomendação oficial nesse sentido, ficando muitas vezes às instituições policiais com a adoção das “recomendações dos fabricantes”, que notoriamente não são balizadas pelos mesmos padrões democráticos que devem ser observados pelo poder público, refletindo muitas vezes a lógica empresarial-capitalista de maximização do lucro. Foi ainda colocada a completa ausência de estudos médicos que avaliem os impactos causados pelo armamento menos-letal no corpo humano.
Com relação a um dos temas mais polêmicos do debate, o professor Half Poscher aduziu que, apesar de ser possível vedar o anonimato nas manifestações alemãs, jamais essa proibição poderá ser apriorística, interditando indiscriminadamente toda e qualquer uso de máscara em manifestações políticas, isto é, somente se proíbe pontualmente, de forma tópica, como resposta à dados concretos apresentados pelas forças de inteligência da Segurança Pública. Dessa forma, o uso de máscara não pode ser subterfúgio para dificultar a responsabilização pela prática de crimes, e como exemplo disso ele citou o caso dos iranianos que protestavam com os rostos encobertos na frente da embaixada do Irã na Alemanha com o legítimo receio de evitar represarias aos seus parentes que ainda moravam em seu país de origem. Segundo o professor alemão, “reuniões são expressões de auto-organização democrática”.
Ainda nesse ponto, interessante observar que, conforme a mais refinada hermenêutica constitucional alemã, brilhantemente lembrado pelo professor Leonardo Martins, a interpretação deve ser sempre restritiva, quando se fala de restrição às liberdades e/ou aos direitos fundamentais. Nesse quesito, pois, não podemos estender a restrição ao anonimato colocada pelo constituinte no Direito de Manifestação do Pensamento (Art. 5º, IV, CF: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”), com o exercício do Direito de Reunião (Art. 5º, XVI, CF), tendo em vista que se tratam de direitos distintos, que recebem tratamento doutrinário e jurisprudencial totalmente autônomos. Dessa forma, objetivar alargar analogicamente a restrição constitucional do anonimato nas manifestações do pensamento para a esfera do exercício do direito de reunião é uma excrescência hermenêutico-constitucional.
Nesse ponto, merece ressalva a fala do representante da Polícia Militar de São Paulo. Foi falado do caráter democrático da PM/SP, que realiza, segundo sua fala, um modelo japonês de polícia comunitária, tropicalizando-o , sendo modelo reproduzido em mais cinco países da América Latina (Honduras, El Salvador, Nicarágua, entre outros). Foi falado que a estatística de 1% de relato de violência policial nas Audiências de Custódia em São Paulo atestam que a PM/SP não é violenta. Foi também apresentada uma estatística de que em 92% das manifestações em São Paulo transcorrem sem qualquer enfrentamento entre a polícia e os manifestantes.
Mas, o que mais me preocupou na fala institucional da PM/SP, foi a apresentação de uma minuta que foi remetida ao governo do estado desde 2015 para regulamentar, à nível legislativo estadual, o direito de reunião. Essa minuta, que segundo colocado foi amparada em decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que trata do uso progressivo da força em caso de “resistência do infrator”. Parece-me sintomático que a indistinção realizada pela leitura da PM/SP da figura do “infrator” para a figura do “manifestante”. Bom, seguimos adiante.
A minuta apresentada estabelece critérios para que possa ser exercido o direito de reunião, descrevendo-os da forma a seguir exposta: i) requisição por escrito; ii) com no mínimo 72 horas de antecedência; iii) informando a natureza da manifestação; iv) o período de realização; v) a utilização de carros-de-som e outros equipamentos; vi) o endereço inicial de concentração do ato; vii) trajeto/itinerário (que deve ser elaborado conjuntamente); viii)Termo de responsabilização dos danos causados no transcurso da manifestação, de qualquer ordem, assinado pelos responsáveis da manifestação; ix) Termo de ciência da vedação ao anonimato, assinado pelos organizadores; e x) a proibição de armas e outros objetos que possam causar dano.
O absurdo da proposta fala por si e será objeto de estudo posterior mais detalhados, mas eu gostaria de chamar uma atenção especial para os itens (viii) e (ix), tendo em vista algumas novas formas de articulação popular e manifestação política presenciada por nós desde junho de 2013. Presenciamos, por exemplo, movimentos populares como o MPL – Movimento Passe Livre, o qual é autônomo, horizontal (e, portanto, sem lideranças hierarquicamente definidas) e pautado pela auto-gestão. Como enquadrar qualquer ato convocado pelo MPL dentro dos critérios exigidos pela PM/SP nesses dois itens destacados?
Sem dúvidas, a proposta fulmina a possibilidade de manifestação, não-convencional e convencional. As formas tradicionais de manifestação (convocadas pelos partidos ou sindicatos, por exemplo) ficará tolhida uma vez que nenhuma pessoa vai assinar em seu nome a responsabilidade por qualquer ato causado no decorrer de qualquer manifestação, por razões óbvias que envolvem o contexto multitudinário e o recorrente e natural enfrentamento provocado pelas forças de segurança durante os protestos no Brasil. Por outro lado, as novas formas de organização de protestos fica totalmente inviabilizada, a começar pela exigência que não comporta o formato próprio de organização desses novos movimentos.
Temos, pois, que as novas manifestações não são amoldáveis às formas normativas abstratas, que é atualmente a única forma de enxergar que o Estado atualmente enxerga esses fenômenos. E, se por um lado, temos amplamente difundida a crise da democracia representativa, temos que fortalecer – e não restringir – todas as formas de democracia direta.
Nessa toada, é relevante deslocar o foco do debate, o qual atualmente paira em volta do exercício do direito de reunião, para o controle da repressão estatal ao livre exercício do direito de reunião. Isso tudo entra em um contexto mais amplo, impossível de ser tratado com profundidade em um texto com essas intenções, de Accountabilty. Isso diz respeito à transparência, controle e previsibilidade.
Assim, como um encaminhamento possível à curto prazo, poderíamos fomentar o debate para criação dos POP´s (Procedimentos Operacionais Padrão), os quais vão conferir segurança aos agentes do Estado (que terão parâmetros claros e determinados sobre os limites da legalidade de sua ação) e aos cidadãos que participam (ou até mesmo transitam eventualmente perto) de uma manifestação de serem tratados por profissionais mais capacitados para esse mister.
Os focos, portanto, devem ser dois: i) expansão do exercício da liberdade em questão (direito de reunião); e ii) promoção de uma cultura policial democrática. Posso dizer que saí bastante satisfeito, tendo em vista que a maioria das falas se pautou pela sensatez e pelo viés democrático de que a restrição ao exercício regular do direito de reunião é uma afronta à dinâmica plural de uma sociedade pretensamente democrática. Qualquer passo nesse sentido é temerário, pois esse debate deve necessariamente se pautar pela contenção/racionalização da repressão e não pela restrição ao livre direito de protestar.
Parabenizo novamente o professor Leonardo Martins pela organização do evento que, repito, teve um nível fantástico de discussões; agradecendo novamente pela oportunidade de me fazer presente.
Vamos regulamentar o direito de reunião?
Esse texto tem a missão de relatar uma experiência recentemente vivenciada, que ocorreu de forma quase completamente aleatória. Durante minha última estadia em São Paulo, aproveitei para participar de um evento organizado por um querido e brilhante professor que tive na graduação, uma das minhas primeiras referências acadêmicas, e um pesquisador de alta patente, com mestrado, doutorado e pós-doutorado na Alemanha: o Professor Leonardo Martins.
Fiquei sabendo do evento poucos dias antes, e aproveitei que cheguei à cidade há tempo de deixar as malas e correr para participar do evento intitulado “Liberdade de reunião e seus limites constitucionais”.
Confesso que quando me dirigia para lá, um frio na espinha me tomava conta da alma… Tratar da mera hipótese de regulamentação do direito de reunião em uma conjuntura como a que o Brasil vive atualmente é uma situação muito temerária.
Ao longo da noite de palestras, pude perceber o tom técnico e qualificado do debate, que buscou trazer a experiência alemã na regulamentação dessa liberdade (direito de reunião) como um modelo indicado para nortear os debates e os trabalhos nesse sentido.
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Contudo, pedindo vênia e já relutando contra a perspectiva mimética para com a teoria alemã, temo que a importação das teorias formatadas por e para os países centrais, que somos acostumados a presenciar no Brasil pode fazer com que tenhamos efeitos colaterais os mais desastrosos, tendo em vista nosso próprio recorte de sociedade periférica-marginal pós-democrática, onde impera a seletividade brutal do nosso sistema punitivo e de nossas agências de controle.
Foi muito bom poder ver um professor meu, talvez a primeira grande referência acadêmica que tive (que parabenizo pela tecnicamente brilhante explanação proferida na ocasião, já citado professor Leonardo Martins), orquestrar todo o evento de altíssimo nível que reuniu pesquisadores de altíssima qualidade, como o Prof. Ralf Poscher da Alemanha (um dos idealizadores da Lei de Reunião alemã), da Professora Flávia Piosevan (que estava representando o Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes) e do Professor Marcos Zili (USP).
Certamente na fala do professor Zilli foi onde mais me senti contemplado. Eu não conhecia o mesmo, mas passei a admirá-lo instantaneamente por impor uma análise realista e consequencialista no debate. Não pude deixar de perceber a sensibilidade com que tratou o tema, inclusive relacionando-a com nossa Lei Anti-terror. Foi a única fala da noite que se colocou claramente contrária à possibilidade de regulamentação dessa liberdade, tendo em vista as especificidades da sociedade brasileira atual. Lançou, ainda, luzes sobre a ideia de que, caso queiramos falar em regulamentação nessa hipótese, devemos observar os limites constitucionais colocados no Art. 5º XVI da nossa Carta Magna.
“Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente” é o texto constitucional que tutela o direito de reunião, e a ele devemos nos ater. Nesse sentido, temos que algumas exigências são colocadas pelo constituinte; mas, somente uma delas dá margem à regulamentação estatal, qual seja: a indicação da autoridade responsável por receber esse “prévio aviso”. Nada mais pode ser regulamentado, pois não há margem normativo-constitucional para isso.
No mais, temos, por exemplo, que as reuniões devem ser “pacíficas”, “não-armadas”, sendo impedidas de frutarem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local e hora. O texto ainda vai além, sendo expresso e claro ao afirmar que as reuniões independem de qualquer “autorização”.
Encerrados os trabalhos do primeiro dia, retorno ao segundo dia pela manhã ao prédio da AASP, para um “café-da-manhã” onde o Ministro Alexandre de Moraes convidava diversas instituições para amadurecer o debate em torno do tema. Além do Professor Ralf Poscher e da representante do organização alemã financiadora do evento, estavam os professores Leonardo Martins e Flávia Piovesan (a qual conduziu os trabalhos em nome do Ministro, o qual, como já citado, não compareceu ao seu próprio “café-da-manhã”).
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Foi falado, ainda, com relação ao uso de armamento menos-letal, em algumas problemáticas. O fato de a regulamentação do uso desse tipo de armamento ser realizado pelo exército, em vez de, por exemplo, o Ministério da justiça (órgão civil), foi uma delas. Outra foi a importância de um debate sério para a elaboração de um “manual” padrão para utilização desses equipamentos, tendo em vista que hoje não há qualquer recomendação oficial nesse sentido, ficando muitas vezes às instituições policiais com a adoção das “recomendações dos fabricantes”, que notoriamente não são balizadas pelos mesmos padrões democráticos que devem ser observados pelo poder público, refletindo muitas vezes a lógica empresarial-capitalista de maximização do lucro. Foi ainda colocada a completa ausência de estudos médicos que avaliem os impactos causados pelo armamento menos-letal no corpo humano.
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Nesse ponto, merece ressalva a fala do representante da Polícia Militar de São Paulo. Foi falado do caráter democrático da PM/SP, que realiza, segundo sua fala, um modelo japonês de polícia comunitária, tropicalizando-o , sendo modelo reproduzido em mais cinco países da América Latina (Honduras, El Salvador, Nicarágua, entre outros). Foi falado que a estatística de 1% de relato de violência policial nas Audiências de Custódia em São Paulo atestam que a PM/SP não é violenta. Foi também apresentada uma estatística de que em 92% das manifestações em São Paulo transcorrem sem qualquer enfrentamento entre a polícia e os manifestantes.
Mas, o que mais me preocupou na fala institucional da PM/SP, foi a apresentação de uma minuta que foi remetida ao governo do estado desde 2015 para regulamentar, à nível legislativo estadual, o direito de reunião. Essa minuta, que segundo colocado foi amparada em decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que trata do uso progressivo da força em caso de “resistência do infrator”. Parece-me sintomático que a indistinção realizada pela leitura da PM/SP da figura do “infrator” para a figura do “manifestante”. Bom, seguimos adiante.
A minuta apresentada estabelece critérios para que possa ser exercido o direito de reunião, descrevendo-os da forma a seguir exposta: i) requisição por escrito; ii) com no mínimo 72 horas de antecedência; iii) informando a natureza da manifestação; iv) o período de realização; v) a utilização de carros-de-som e outros equipamentos; vi) o endereço inicial de concentração do ato; vii) trajeto/itinerário (que deve ser elaborado conjuntamente); viii)Termo de responsabilização dos danos causados no transcurso da manifestação, de qualquer ordem, assinado pelos responsáveis da manifestação; ix) Termo de ciência da vedação ao anonimato, assinado pelos organizadores; e x) a proibição de armas e outros objetos que possam causar dano.
O absurdo da proposta fala por si e será objeto de estudo posterior mais detalhados, mas eu gostaria de chamar uma atenção especial para os itens (viii) e (ix), tendo em vista algumas novas formas de articulação popular e manifestação política presenciada por nós desde junho de 2013. Presenciamos, por exemplo, movimentos populares como o MPL – Movimento Passe Livre, o qual é autônomo, horizontal (e, portanto, sem lideranças hierarquicamente definidas) e pautado pela autogestão. Como enquadrar qualquer ato convocado pelo MPL dentro dos critérios exigidos pela PM/SP nesses dois itens destacados?
Sem dúvidas, a proposta fulmina a possibilidade de manifestação, não convencional e convencional. As formas tradicionais de manifestação (convocadas pelos partidos ou sindicatos, por exemplo) ficará tolhida uma vez que nenhuma pessoa vai assinar em seu nome a responsabilidade por qualquer ato causado no decorrer de qualquer manifestação, por razões óbvias que envolvem o contexto multitudinário e o recorrente e natural enfrentamento provocado pelas forças de segurança durante os protestos no Brasil. Por outro lado, as novas formas de organização de protestos fica totalmente inviabilizada, a começar pela exigência que não comporta o formato próprio de organização desses novos movimentos.
Temos, pois, que as novas manifestações não são amoldáveis às formas normativas abstratas, que é atualmente a única forma de enxergar que o Estado atualmente enxerga esses fenômenos. E, se por um lado, temos amplamente difundida a crise da democracia representativa, temos que fortalecer – e não restringir – todas as formas de democracia direta.
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Originalmente publicado no portal Justificando.
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